quinta-feira, 19 de março de 2009

AO PERSISTIREM OS SINTOMAS OS MÉDICOS DEVERÃO SER CONSULTADOS SOBRE O COLAPSO DE SUA DIGNIDADE PROFISSIONAL

Nós, os médicos, estamos sendo agredidos a cada momento com o apelo em favor da auto-medicação: é quando a propaganda de remédio finaliza cada anúncio com a cínica advertência de que, AO PERSISTIREM OS SINTOMAS, UM MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO. É como se o fabricante de tais remédios esteja a dizer ao sofrido povo brasileiro: OLHE, CONSUMA EM MASSA ESTA PORCARIA PARA QUE EU LUCRE MACIÇAMENTE, MAS, SE ALGO DER ERRADO, FIQUE TRANQÜILO, OS MÉDICOS SERÃO MEUS CÚMPLICES. Sim, os médicos cuidarão da trapalhada e terão renda adicional às custas desta mesma trapalhada. Em suma, esta farsa está levando o médico a participar de gravíssimo crime, que é o incitamento à auto-agressão. Como os Conselhos Federal e Estadual de Medicina até agora não agiram - tal cumplicidade já deixou de ser condenavelmente passiva para ser inacreditavelmente ativa. Em minhas palestras, sempre toco nesse assunto, para dizer que A PERSISTENCIA DESSA CÍNICA ADVERTENCIA deve ser assumida como indicador central do colapso da profissão médica no Brasil. No dia em que tal advertência deixar de ser veiculada, será o sinal de que enfim o médico brasileiro começa a recuperar sua dignidade profissional. Nesse dia, o médico estará começando a se reerguer das bofetadas que lhe vêm sendo inflingidas a cada anúncio. E, nesse dia, os orgãos corporativos estarão deixando de se curvar, saindo de sua posição de vergonhosa submissão e de inofensiva complacência, para afirmarem que existem de fato.

sexta-feira, 13 de março de 2009

JOÃO MENEZES NETO - nepomucenense de memória inigualável e rara inteligência crítica
João Amílcar Salgado
Na minha infância, quando éramos vizinhos, ele era o Joãozinho da dona Norvina, isto porque, na Vila daquele tempo, as crianças eram das mães e não dos pais. Eu, por exemplo, era o Amírca da dona Vange. Só que o João(zinho) Menezes Neto estudava na cidade na casa dos avós, enquanto seus pais ficavam lá na fazenda do Sapé. Então ele era da dona Norvina, mais especificamente, Norvina Garcia Frade Menezes, sua avó paterna, que também pode ser considerada minha avó emprestada, de tanto que eu passava os dias em sua casa e em sua companhia. Ela morava no comércio, como se dizia, mas, na sua prosa, nos seus cacoetes e principalmente nas coisas deliciosas de sua cozinha, ela nunca abandonou a legendária fazenda do Morembá, onde foi criada e de onde saiu para casar com o João Evangelista de Menezes, o maior amigo de meu pai. A dona Norvina, (comadre de minha mãe por ser madrinha de minha irmã Neusa) foi uma das pessoas mais adoráveis que conheci.
O Joãozinho Menezes, desde pequeno, passou a jogar futebol no campinho da rua Nova (rua João Inácio Dias), de onde surgiram vários craques da Vila, um deles ele, que, quando foi estudar e jogar no Instituto Gammon em Lavras, recebeu o apelido de Farelinho, com o qual foi aplaudido goleador nos estádios da região. E nesse colégio ele brilhou também no atletismo, projetando-se como velocista. Melhor ainda foi seu desempenho nos estudos, diplomando-se excelente dentista. No curso e na prática odontológica logo se revelou não só hábil mas ágil cirurgião, de tal maneira que, se tivesse cumprido seu desejo de estudar também medicina, teria feito enorme sucesso como médico cirurgião. De qualquer modo essa sua vocação médica vem sendo concretizada por meio do filho Henrique Lima de Menezes, meu ex-aluno que se revelou médico de rara competência e impressionante dinamismo, do neto Marcelo Menezes Breyner e certamente de outros descendentes.
Usando de minha condição de pedagogo na área da saúde, afirmo que é uma pena que este cérebro maravilhoso não tenha sido professor universitário. Ele tem uma espécie incomum de capacidade de memorização: a memória enciclopédica associativa. Isso quer dizer que seus neurônios acumulam as informações não só sem qualquer esforço, mas as conservam automaticamente associadas. O engenheiro Antônio Lívio Salgado, ex-diretor das Centrais Elétricas de Minas Gerais, confessou-me que o João Menezes Neto foi o melhor entre os melhores professores que encontrou em nosso antigo Ginásio São José, onde ministrou aulas de Ciências, com invejável firmeza e indelével clareza. Todos os conterrâneos já sabem dessas suas qualidades superiores, principalmente os que já conversaram com ele sobre três assuntos: futebol, parentesco e anedotário municipal.
De futebol fala de cátedra, pois, além de ex-craque, acompanha o noticiário cotidiano e, na rua em que mora, a cada minuto, topa alguém com quem lembra um momento memorável do futebol nepomucenense, brasileiro ou mundial. Por exemplo mostrei-lhe uma foto emprestada pelo Bôca (Clécio Felicori, outro brilhante ex-craque) e ele identificou cada pessoa, sendo que a foto era de 1937! E ele arrematou: o Romeu Felicori, este aqui, foi um jogador tão excepcional que, se tivesse aceito o convite para carreira fora da Vila, teria chegado à seleção nacional.
Em matéria de parentesco, o Joãozinho foi preciosa fonte para sua prima, a Denise Garcia, quando ela escrevia o livro OS GARCIA-FRADE. Certo dia ele me perguntou se o escritor Luiz Vilela havia localizado o nome dele entre os Garcia-Frade. Respondi que eu mesmo fiz essa pergunta ao Luiz e este me disse que ouvira falar por alto da publicação. O Joãozinho ficou surpreso e exclamou: Então ele, um escritor, não leu o livro?!.... Depois de acalmá-lo, expliquei que há pessoas, mesmo escritores, que não dão valor a parentescos. E acrescentei: isso indica que os estudiosos de genealogia não são tão comuns e devem ser estimulados, pois a história de Minas Gerais só pode ser conhecida por meio dos segredos escondidos nas árvores genealógicas.
No anedotário municipal, o Joãozinho também não tem competidor. Alguns dos melhores causos de meu livro O RISO DOURADO DA VILA foram fornecidos por ele, que, aliás, em virtude destes e outros subsídios, deveria figurar como co-autor da obra. Além disso, ele é primo do Vito Paca (Vítor Menezes Bernardes) e sobrinho-neto do Joãozico Meneiz (João Batista de Menezes). O Vito e o Joãozico são dois dos personagens-campeões do anedotário da Vila. O repertório de ambos foi-me passado pelo Joãozinho por meio de uma áudio-fita, que gravei em duas longas e gargalhantes tardes.
Mais que dos Garcia-Frade, o Joãozinho é o cronista da família Menezes. Os Menezes de Nepomuceno se ligam aos aristocratas Menezes da Espanha e Portugal, que vieram para o Brasil antes de D. João VI e com ele. São gente da alta nobreza documentada desde o século IX, remontando, a partir dos Teles de Menezes, às casas reinantes dos reis leoneses-asturianos. Ao longo desse tempo milenar, somam escritores, governantes, militares, religiosos, profissionais liberais, educadores, historiadores, artistas e desportistas.
Em Nepomuceno, os primeiros Menezes notáveis são um militar, herói da Guerra do Paraguai e da Retirada da Laguna – o Capitão João Antônio de Menezes - e um sacerdote - o Cônego João Evangelista de Menezes - hoje nome da antiga praça do Rosário. Aos dois deve ser acrescentado um primoroso artista, autor da nossa escultura do SENHOR MORTO (e de outros lavores na Matriz de Campo Belo): Francisco Gorgonha de Menezes. Os três são filhos do ilustre cidadão campobelense Manuel Francisco de Menezes. Outra cidade que conta com ilustres consanguíneos do ramo destes Menezes é Piumhi.
Quando o Joãozinho e eu relatamos tal origem fidalga ao hoteleiro João Tito de Menezes, ele exclamou: eu devia saber disso há mais tempo, para cortar o topete de muita gente metida a ser de família importante e que, vai ver, não é nada! O próprio João Tito deveria ser nome de mais de um lugar. Proponho que a chamada Ponte dos Menezes passe a chamar-se PONTE DO TITO MENEZES, como a chamávamos.
Já o Joãozinho da dona Norvina, esse também é digno de homenagem mais que merecida. Sugiro que o governo municipal, além de mudar o nome da ponte, outorgue formalmente ao seleto João Menezes Neto o título com o qual o povo da Vila já o consagrou: o de HISTORIADOR EMÉRITO DE NEPOMUCENO.

O autor é professor da Universidade Federal de Minas Gerais e historiador do Sul de Minas

quinta-feira, 12 de março de 2009

OS 80 ANOS DE CLIMAR PAIVA – ILUSTRE ALVES VILELA
Os cidadãos nativos e adotivos da Vila estão acompanhando com aplauso a sucessão de reuniões de clãs locais. No momento, a propósito da terceira reunião dos Alves Vilelas, sugiro duas coisas. Primeiro, que todas as demais famílias nepomucenenses façam congraçamentos semelhantes. Segundo, que a próxima dos Vilelas seja uma reunião conjunta de todos os sub-ramos, numa autêntica VILELADA.
A primeira festa foi a dos 90 anos da mui amada Maria Tagliaferri Vilela, na agradável fazenda de sua filha Glorinha, regida (a fazenda e a comemoração) pelo esposo desta, o Toninho Lima Reis – imbatível na fidalguia com que recebe cada um e a todos. A segunda, comandada pelo casal Roberto Vilela Gonçalves e Elina Lima, foi a reunião dos numerosos descendentes do legendário João Alves Vilela Lima. Este foi um Alves Vilela autêntico e tão marcante e em tantos aspectos, sobretudo por sua inventividade e sua habilidade fitoterapêutica, que será objeto de livro biográfico, coordenado pelo neto Evódio Vilela – destacado docente da Universidade Federal de Lavras. A terceira acaba de ocorrer em comemoração aos 80 anos (que parecem menos de 60) da vitoriosa Climar Vilela Paiva, quando foi oportuno homenagear também seu saudoso esposo Jainir Santos Paiva (nosso Nininho), os filhos, irmãos e inesquecíveis genitores.
Divulguei ali um texto que assim termina: Exemplo ilustre dos Alves Vilelas de Nepomuceno são os filhos do casal Jainir-Climar: MARCOS, EDILSON, RENATO e LUCIANO. São todos engenheiros agrônomos (como outros notáveis Vilelas agrônomos), com pós-graduação nos EUA e que brilham na Universidade, na Embrapa ou como empresários – um por um verdadeiros cientistas que honram o boom agrícola que ora vivemos e, mais que isso, a tradição de pesquisa agronômica de Minas e do Brasil. Em Ituiutaba, exemplo igualmente nobilitante dos Alves Vilelas é o jurista João Batista Vilela (como outros notáveis Vilelas juristas e escritores), astro maior, em Minas, no Brasil e no exterior, na especialidade do Direito Privado.
Em adendo especial, fiz a seguinte evocação:
CLYDE ALVES VILELA – MINHA TERNA REFERÊNCIA NO PANFLETO E NO HUMOR
Clyde Alves Vilela, meu inesquecível Tio Lela, recebeu este nome inglês de meu avô Joaquim Alves Vilela, que primou por escolher nomes sofisticados da história e da literatura para os filhos: DEMÉTRIO, ADELAIDE, ADÉLIA, LICÍNEA, CLYDE e EVANGELINA. O povo da Vila recusou a pronúncia inglesa e fez bem em apelidar o Clyde de Lela. Ele foi uma inteligência incomum, exímio e criativo farmacêutico (inventou vários remédios de manipulação) e também temido panfletário na política municipal. Estas qualidades me foram espontaneamente apontadas por seu parente e amigo de juventude Oscar Negrão de Lima, catedrático de Medicina Legal da atual UFMG.
Além de usar de inteligência e criatividade privilegiadas no exercício profissional, no jornalismo partidário e no jogo de xadrez, usou-as em duas outras áreas, hoje marco na tradição de nossa família. Foi um dos contribuintes célebres ao folclore estudantil de Ouro Preto, para onde, no curso de Farmácia, levou o senso de humor inigualável de sua cidade natal – e criou para os filhos que teve com a também inesquecível tia Mariinha (Maria Cardoso Vilela) nomes tão originais quanto designativos de algumas das pessoas mais estimadas da vida nepomucenense: CLIMAR, MARCLI, CLYDE, ILCRAM e RAMILC. Em meu livro de memórias O RISO DOURADO DA VILA, de 2003, procurei deixar fixados para sempre estes e outros dos traços essenciais desse paradigmático grupo familiar sulmineiro.

O autor João Amílcar Salgado é professor titular de Clínica Médica e pesquisador em História da Medicina e do Sul de Minas da Universidade Federal de Minas Gerais