domingo, 20 de março de 2011


A VISITA DE MARIA E IRENE CURIE A BELO HORIZONTE EM 1926

João Amílcar Salgado

Em 1926, a polonesa Manya Sklodowska Curie (Madame Curie) havia recebido dois prêmios Nobel. O primeiro de física, em 1903, com o marido Pierre e com Henri Becquerel, pela descoberta da radiatividade, e o segundo, de química, em 1911, pela descoberta do metal radiativo radium. Neste ano, fazia 20 anos que enviuvara pelo atropelamento de Pierre e sua filha francesa Irene ainda não havia recebido seu prêmio Nobel de química, junto com o marido Frederico Joliot, com quem se casaria neste mesmo ano de 1926. Recebeu-o oito anos depois, pela descoberta do primeiro isótopo artificial. Ambas chegaram de trem a Belo Horizonte em agosto desse ano e vieram acompanhadas da paulista Carlota Pereira de Queiroz, uma das pioneiras feministas no Brasil, eleita em 1933 a primeira mulher deputada federal brasileira. Tiveram o privilégio de ouvi-las, na Faculdade, os quintanistas de medicina Pedro Nava, Pedro Sales e Juscelino Kubistchek, o terceiranista Amílcar Martins, o segundanista João Guimarães Rosa e o primeiranista Osvaldo G. Costa – todos futuros famosos ex-alunos.

A razão da presença das cientistas era o Instituto do Radium. Belo Horizonte fora escolhida para sediá-lo no Brasil, como primeiro das Américas e parte da rede internacional de institutos dedicados ao uso e ao estudo do radium em medicina. A escolha se explica pelo relacionamento de seu realizador Borges da Costa (um dos fundadores da primeira escola médica mineira, acima referida, hoje da UFMG, e um dos pioneiros da moderna cirurgia em Minas) com os centros médicos da Europa, especialmente na França. Sua inauguração foi prevista para o centenário da Independência (com 25 centigramas de radium), mas coincidiu também com a chegada da Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira. A Bélgica era o único fornecedor do radium, graças às minas de urânio de Katanga no então Congo Belga. Curiosamente, Artur Bernardes, que, com Barbosa Lima Sobrinho, forma a dupla de maiores nacionalistas brasileiros, apoiou a construção e esteve presente na inauguração do Instituto. A maquete deste, mostrando notável arquitetura, foi levada a Estrasburgo no centenário de Pasteur. Desta cidade viria, depois das Curies, o grande cirurgião René Leriche, para cirurgias demonstrativas no Instituto.

Integravam a equipe do Instituto que recebeu as cientistas: Baeta Viana, em vias de criar a maior escola de bioquímica da América Latina; Mário Pena, o primeiro curieterapêuta do país; e Carlos Pinheiro Chagas (primo do descobridor Carlos Ribeiro Chagas), patologista que brilhara como aluno de McCallum na Universidade de Colúmbia, EUA, mas que se fez célebre como orador no sepultamento de João Pessoa, no início da Revolução de 30.

Enquanto o Instituto do Radium (hoje Borges da Costa), a visita das Curies e Costa representavam forte ligação de Minas com a França, Luxemburgo e a Bélgica, em nome da nova tecnologia - um mineiro de Juiz de Fora, Antônio da Silva Melo, seria o nexo entre Minas e o Instituto do Radium de Berlim, onde participou dos estudos - no contexto da competição franco-germânica – que delimitaram os riscos da nova terapia.

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