sábado, 18 de dezembro de 2010

A SAÚDE E A EDUCAÇÃO NO GOVERNO DILMA

João Amílcar Salgado

O ministro da saúde Temporão e o ministro da educação Hadad do governo Lula – por terem sido tão trapalhões em áreas tão sérias - deveriam ser substituídos por gente mais competente, no novo governo Dilma. De todo o ministério, são os dois mais difíceis de substituir, pois – por mais trapalhões que tenham sido – se mostraram ambos muito bem acomodados aos interesses mercantis ligados tanto à saúde como à educação.

Aos estrategistas de Dilma, a questão desde cedo foi a seguinte: é necessário substituir os dois, mas como encontrar dois substitutos que - no afã de serem menos trapalhões - não acarretem o risco de contrariar os interesses mercantis ligados à saúde e à educação, de tal modo que acabem engendrando duas crises graves no início de um governo, cuja prioridade é transparecer paz e amor?

A partir da ditadura 64-84, os sucessivos governos cevaram seis monstros, que passaram a ser monstros quando perceberam que estavam sendo tratados ou com incompetência, ou com medo ou com promiscuidade ou com a mistura de tudo isso. São as indústrias do pré-pagamento em saúde, do ensino mega-lucrativo, do narcotráfico, da corrupção nos três poderes, do sistema bancário e do desmatamento – que são seis indústrias freqüentemente sócias umas das outras.

No caso da saúde, a incompatibilidade de um sistema único com um PARA-SISTEMA PSEUDO-SUPLEMENTAR, mas que de fato é COMPLEMENTAR, exigiria um ministro-estadista, acompanhado de equipe de mesmo nível, encarregado de solucionar tão gigantesca aberração institucional, com mega-interesses já fortemente estabelecidos.

No caso da educação, está clara a incompatibilidade entre, de um lado, a busca obsessiva em criar um sistema de avaliação educacional, ostensivamente apenas quantitativo, e, de outro lado, a avidez por uma educação de verdade, inescapavelmente qualitativa, manifestada por camadas cada vez maiores da gigantesca população recém-incluída na renda nacional. Isso exigiria bem mais do que um simples Hadad, à frente de equipe mil vezes melhor. A compatibilidade da MÁQUINA DE AVALIAR com O QUÊ AVALIAR seria menos difícil há trinta anos, mas hoje, com os mega-interesses da indústria-do-lucro-fácil em educação, a tarefa é também para estadista. Quem correria esse risco?

Sobre os quatro outros monstros algo semelhante poderíamos dizer. Em vez de falar sobre eles, quero relembrar aqui o texto SAÚDE E EDUCAÇÃO NO GOVERNO LULA que publiquei no tablóide CAROS AMIGOS, por ocasião da posse de Lula em seu primeiro governo:

“Depois de três meses do início de seu governo [março de 2003], Lula vai fazer cinco perguntas a seu ministro da saúde e cinco perguntas a seu ministro da educação.

Ao da saúde:

1. O dinheiro da saúde continua escasso e sendo gasto para remunerar mal os que se esforçam para manter os doentes em pé, enquanto sobra para remunerar bem os que lucram com seu decúbito – e apenas com o decúbito lucrativo?

2. O atendimento oferecido no nível periférico continua sem avaliação ou com avaliação apenas quantitativa? Se continua assim, quando haverá o rigor desejável em verificar a resolubilidade de cada nível, sem distinção?

3. A Constituição continua sendo desrespeitada em relação aos chamados planos de saúde, ou seja, continuam legitimados pelo cínico artifício de chamá-los de planos e, pior, de planos de saúde, e, pior ainda, de assistência complementar?

4. O controle social do atendimento continua sendo usurpado por ilegítimo colegiado de secretários, em detrimento dos conselhos municipais, estaduais e nacional, reorganizados com a representação desta vez legítima?

5. As denúncias de desatendimento e de escândalos continuam sendo amenizadas ou apagadas do noticiário pelo recurso a artifícios de marketing, custeado pelo orçamento da própria saúde?

Ao ministro da educação as perguntas serão as seguintes:

1. A expansão da educação brasileira continua entregue ao gangsterismo educacional, isto é, a compreensível sede de ascensão social pela escada do diploma continua mercadejada na bacia-das-almas do enriquecimento fácil?

2. O ministro continua iludindo a gigantesca clientela escolar, fazendo parecer que avaliações de fachada são o antídoto mágico para a ostensiva falta de escrúpulos do a-sistema vigente?

3. O que restou do anterior sistema público – da pré-escola ao pós-doutorado – continua sendo tratado a pão-e-água, com vil remuneração docente, enquanto subsídios diretos e indiretos continuam sendo facilmente distribuídos a escolas privadas e a falsas instituições não-lucrativas?

4. Os conselhos municipais, estaduais e nacional continuam submetidos a obscuros critérios de barganha política, de tal modo que permanecem sob o controle dos industriais da educação?

5. As denúncias de distorções e descalabros continuam amenizadas ou apagadas do noticiário pelo uso de artifícios de marketing custeados pelo orçamento da própria educação?

Em acréscimo a essas dez perguntas, podemos formular mais uma, que muito bem representa o compromisso conjunto para com a saúde e a educação: o novo governo continua tratando mal os hospitais universitários?

O hospital universitário é o ponto culminante da solidariedade entre saúde e educação. Assim, serve como indicador ideal da seriedade com que ambas são tratadas. Para melhor explicitar tal responsabilidade, podemos desdobrar a pergunta em três questões dela derivadas: a) os hospitais universitários continuam sendo tratados como entidades pedintes, a serem atendidas com sobras ou gambiarras orçamentárias?; b) continuam objeto de jogo-de-empurra entre os dois ministérios respectivos?; e c) continuam obrigados a disputar sua renda própria no mercado distorcido e selvagem?

Tais interrogações são apropriadas e oportunas neste início de administração, porque o colorido dramático do caos diário na saúde, mais visível do que o semelhante na educação, parece apalermar os mais diligentes administradores. De fato, o custo em dor e morte é tal que mesmo a inegável competência de alguns de nossos técnicos se vê dispersa e desgastada pelo varejo de remendos a esmo. Assim, nada justifica qualquer demora na tomada de decisões corajosas e responsáveis.

SUGERIMOS AOS DOIS MINISTROS QUE TENTEM RESPONDER A ESTAS PERGUNTAS A CADA FINAL DE SEMANA” [Insisto: isso foi em março de 2003].

Diante do relatado acima, pode-se deduzir que Lula foi muito esperto em seus oito anos de governo. Avaliou a dimensão dos monstros, na época já enormes, já que foram muito bem cevados no hediondo governo FHC. Decidiu então governar pelas brechas que genialmente vislumbrou entre as poderosas patas dos mesmos. Se os contrariasse, não haveria governabilidade. Foi muito bem sucedido com essa saída. Tanto que se tornou O CARA. Acontece que deixou de herança para a Dilma os mesmos monstros, mais cevados ainda. Daí a dificuldade que ela já está tendo, especialmente na saúde e na educação - e que já ficou demonstrada na incapacidade para substituir Hadad e no medo de nomear Ciro Gomes para a Saúde.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

SOBRE A PROIBIÇÃO DA VENDA LIVRE DE ANTIBIÓTICOS - OU DE COMO PROTEGER OS QUE LUCRAM COM A AUTOMEDICAÇÃO

João Amílcar Salgado

Está em vigor desde 29/11/10 a restrição à venda de antibióticos e outros antimicrobianos (Resolução 44/10 da ANVISA), que consiste na retenção de uma via da receita médica e a anotação dos nomes do médico, do paciente e do medicamento, bem como a quantidade deste.

Tal restrição, nas circunstâncias em que é promulgada, revela a hipocrisia dos atuais responsáveis pela ANVISA

Em primeiro lugar, a venda livre de antibióticos e outros antimicrobianos já estava proibida e nada vinha acontecendo aos que, a cada dia e a cada hora, desrespeitavam o impedimento. Agora decretam uma proibição repetitiva, com pretexto de dificultar a transgressão. Ora, isso significa concordar com esta, não passando de um escape gesticulativo, equivalente a trancar uma porta já arrombada.

Em segundo lugar, nenhuma medida contra algum tipo de automedicação terá credibilidade no Brasil, enquanto a própria ANVISA autoriza genericamente a automedicação – autorização esta que é acobertada pelo silêncio cúmplice do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, do CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA, da ASSOCIAÇÃO MÉDICA BRASILEIRA e de demais instancias responsáveis.

Assim, a ANVISA, como agência fiscalizadora, se autodesmoraliza o tempo todo, quando, com aquela proibição específica e esta autorização contraditória, é tolerante com gravíssimo risco à saúde. E o pior é que tão grande risco decorre de criminosa indulgência para com a cobiça financeira da indústria farmacêutica. Tudo isso retrata inominável irresponsabilidade governamental.

O médico acaba arrastado, como cúmplice forçado, em tal descalabro. Para avivar os contornos do ultraje em que o médico é aí envolvido, transcrevo a denúncia contra a mais renitente das propagandas de automedicação, disseminada por todas as modalidades de mídia.

Em 16 de dezembro de 2001, submeti a seguinte denúncia ao Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais

Ilmos. Srs. Membros do Plenário do Conselho

Na qualidade de médico, professor de medicina e cidadão deste Estado de Minas Gerais, sinto-me no direito e no dever de, respeitosamente, solicitar informação a este plenário sobre anúncios publicitários que passaram a ser veiculados em nossos canais de televisão. Trata-se de propaganda de medicamentos que termina por apresentar a seguinte advertência ou equivalente: A PERSISTIREM OS SINTOMAS SEU MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO.

A menos que a automedicação já esteja tacitamente aceita pelas entidades médicas e, pior que isso, autorizada a ser incentivada por meios publicitários – solicito ser informado oficialmente quais as medidas que este Conselho tomou ou está tomando diante do fato, que suponho seja do conhecimento de cada membro deste plenário.

Pedindo desculpas pela indignação que está por trás desta solicitação, apresento os protestos de minha mais alta consideração e de minha firme confiança na preservação dos princípios fundamentais da ética de nossa profissão, acima de quaisquer interesses mercantis. Atenciosamente, João Amílcar Salgado.

Infelizmente não tive conhecimento de que esta denúncia tenha sido apreciada pelo plenário do Conselho. Com o prosseguimento impune da propaganda denunciada expressei minha indignação no III Congresso Mineiro de História da Medicina (28-30/09/06) em texto com clara advertência sobre o caos progressivo da saúde e da educação, intitulado DURAS VERDADES SOBRE SAÚDE E EDUCAÇÃO. Desse documento, o primeiro tópico traz o seguinte subtítulo: AO-PERSISTIREM-OS-SINTOMAS É UMA BOFETADA HISTÓRICA NA DIGNIDADE PROFISSIONAL DO MÉDICO.

Nele manifesto minha repulsa à dupla agressão com que somos atingidos diariamente, decorrente de ostensivo apelo à automedicação, que se completa em acintoso e cínico lembrete: ao persistirem os sintomas o médico deverá ser consultado. E concluo: A vigilância sanitária, os ministérios da saúde e das comunicações, bem como as entidades médicas e dos farmacêuticos são, portanto, inescapáveis co-réus deste duplo crime. Duplo por que? Não contente em pôr em risco a população pelo incitamento à automedicação, o anunciante constrange os médicos, e à própria revelia destes, a passivos cúmplices e a humilhados legitimadores de tão infame e perversa gana consumista.

sábado, 27 de novembro de 2010

SOBRENOMES MATRICIAIS DE LAVRAS E NEPOMUCENO

João Amílcar Salgado

AS FAMÍLIAS COSTA, PÁDUA E SALES de Lavras têm origem nos três filhos do luso MANOEL COSTA VALE, que, no Brasil, se casou com MARIA DO ROSÁRIO PEDROSO DE MORAIS, de tradicional tronco bandeirante. São eles: ANTÔNIO DE PÁDUA SILVA LEITE, FRANCISCO JOSÉ COSTA e o capitão MANOEL JOAQUIM COSTA. Do enlace entre descendentes dos dois primeiros surgiram tanto os Pádua como os Sales, sendo que deles descende o educador, filólogo e historiador Firmino Costa, autor dos presentes dados. Demais, dos dois primeiros descende o tenente coronel FRANCISCO ANTÔNIO SALES, que se matrimoniou na renomada família RIBEIRO-DE-OLIVEIRA-PENA de Entre-Rios de Minas, por meio de sua esposa ANA FELIZARDA RIBEIRO DE OLIVEIRA, sendo ambos avós de Francisco Antônio Sales (1873-1933), que foi Prefeito de Belo Horizonte, Governador de Minas Gerais, Senador e Ministro da Fazenda.

O terceiro filho do casal Manoel Costa Vale e Maria Pedroso-de-Morais é o capitão MANOEL JOAQUIM COSTA, que se casou (em segundas núpcias) com MARIA DE SOUZA MONTEIRO. Uma dos nove filhos desse casamento, Maria de Souza Monteiro Costa, se casou na família Lima, por meio de seu esposo José Antonio de Lima, apelidado de Casaquinha. Dos referidos nove filhos, o de maior significado histórico, por seu casamento e sua descendência, é o capitão VICENTE MARTINS FERREIRA DA COSTA (1805-79). Ele também se casou na família Ribeiro-de-Oliveira-Pena de Entre-Rios de Minas, do mesmo modo que seu antes citado primo tenente-coronel Francisco Antônio Sales. Se este se casou com Ana Felizarda, o capitão Vicente se casou com a irmã desta, MARIA RITA RIBEIRO DE OLIVEIRA.

Do casal Vicente e Maria Rita, nasceram 18 filhos, dos quais onze se tornaram adultos. Destes onze, três se casaram na família Lima: Ana Idalina (com José de Lima), Maria da Conceição (com Francisco Lima) e José Augusto (com Mariana Corrêa Lima). Nas gerações seguintes, a maior parte dos descendentes se matrimoniou com portadores do sobrenome Lima, em meio a alto grau de consangüinidade. Entre tais descendentes, predominou a tendência em não insistir com os sobrenomes anteriores: VALE, LEITE, PEDROSO, MORAIS, MONTEIRO, BOTELHO, MARTINS, FERREIRA, SILVA E PENA. O sobrenome correto RIBEIRO DE OLIVEIRA COSTA às vezes é substituído por Ribeiro Lima, em virtude da forte presença Lima entre os descendentes. No ramo Ribeiro de Oliveira Costa sobressaem o Governador do Estado da Guanabara, Ministro e Embaixador Francisco Negrão de Lima, bem como os Prefeitos de Belo Horizonte Otacílio Negrão de Lima e João Pimenta da Veiga Filho.

Vale lembrar que o sobrenome Pádua passou de prenome a sobrenome provavelmente como maneira de enfatizar a relação de parentesco da família com os Bulhões Taveira. Este ramo muito se orgulha do parentesco com o extraordinário pregador Santo Antõnio. Ele é cognominado Santo Antônio de Pádua (localidade italiana onde adquiriu imediata devoção, sendo o santo de mais rápida canonização) mas é denominado também Santo Antônio de Lisboa (cidade onde nasceu). Assim, é fácil compreender que Santo Antõnio fosse homenageado por meio do nome de um dos três filhos do casal Manoel Costa / Maria Pedroso. Já o nome Sales resultou da homenagem, por meio do nome de um dos netos deste mesmo casal, feita não a um, mas a dois santos ao mesmo tempo: Santo Antônio e São Francisco de Sales, sendo este de devoção entre os que aspiravam à reconversão de protestantes ao catolicismo.

Também não se pode esquecer que, ao lado daquele ramo Lima que se ligou predominantemente à família Ribeiro de Oliveira Costa, a família Lima já era importante no povoado de Nepomuceno, inclusive em ligação com os Garcia, os Figueiredo e os Vilela. Daí resultaram os dois únicos barões do império nascidos em Nepomuceno: Gabriel Garcia de Figueiredo – Barão de Monte-Santo, nascido em 1816, e José Caetano de Lima – Barão de Mogi-Guaçu, nascido em 1821 e primo do primeiro – ambos migrados de Nepomuceno para a região das atuais cidades de Mococa e Casa Branca, no Estado de São Paulo.

Em Nepomuceno, sobrenomes ligados ao tronco Costa-Pádua-Sales-Ribeiro de Oliveira são: Ribeiro, Sales, Lima, Lima Pádua, Lima Costa, Lima Rabelo, Ribeiro Lima, Corrêa Lima, Cambraia Lima, Oliveira Lima, Garcia Lima, Veiga Lima, Barbosa Lima, Vilela Lima, Lima Salgado, Cardoso Vilela, Vilela Teixeira, Vilela Salgado, Teófilo Salgado, Salgado Lourençoni, Salgado Andrade, Augusto Lourenção, Flávio Pimenta e Veiga Sales.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

COM HADDAD E TEMPORÃO, DILMA NÃO PRECISA DE INIMIGOS

EM NOVEMBRO DE 2009 PUBLICAMOS O TEXTO A SEGUIR E, AGORA, UM ANO APÓS, EM OUTRO EXAME DO ENEM, A COISA SE REPETE!. QUERO RESSALTAR QUE NÃO VOTEI CONTRA A DILMA. MINHA QUESTÃO SÃO A EDUCAÇÃO E A SAÚDE, EXATAMENTE AS DUAS ÁREAS EM QUE SOU ESPECIALISTA. COM ESSES DOIS MINISTROS, A DILMA NÃO PRECISA DE INIMIGOS! NINGUÉM PERCEBE?

EM MEIO A MEGA-DESASTRES, NAVEGA NOSSA NAU DOS INSENSATOS, COM A SAÚDE E A EDUCAÇÃO A BORDO

Quanto mais bem sucedido vem sendo o atual governo na melhoria da distribuição de renda no país, mais escandaloso é seu fracasso em saúde e educação. Em meio a mega-desastres aéreos e à violência crescente, ninguém está dedicando atenção a nosso risco como passageiros desta verdadeira nau dos insensatos,capitaneada pelos ministros da saúde e da educação.

É ledo engano pensar que uma boa notícia, como o anúncio do pré-sal ou o reconhecimento do BRIC, seja capaz de compensar a derrocada na saúde e na educação. Tais boas-novas desviam a atenção, anestesia dores menores, produz refresco breve – mas as duas feridas largas e profundas, da saúde e da educação, prosseguem subsistentes. Já as más notícias, principalmente a péssima notícia, como de três mega-desastres aéreos recentes ou da violência endemo-pandêmica, podem aprofundar a anestesia, mas seu efeito é igualmente temporário.

E os próprios respectivos setores governamentais se encarregam de reacender, rápido, o ferro-em-brasa da débâcle na educação e na saúde. Isso acontece quando, de modo trapalhão, tentam melhorar as coisas, mas acabam piorando tudo e fazendo tudo ficar irreversível. Por exemplo, no hemisfério norte, tenta-se responder ao craque imobiliário com duras medidas não só contra a farra de contas em paraísos fiscais, de lucros, de salários e despreads, mas também contra a cultura da irresponsabilidade ou contra os dispositivos controladores cevados na promiscuidade explícita com os controlados. Enquanto isso, aqui tudo prossegue como-dantes-no-quartel-de-abrantes – com farra análoga, só que maior, com a mesma cultura, só que ao jeitinho brasileiro, e com igual promiscuidade, só que muito mais cínica.

Na educação, acabam de transformar o ENEM (herança maldita do fiasco do provão) num arremedo de “exame vestibular nacional”, no qual qualquer cultor do óbvio é capaz de reconhecer autêntico vôo-cego de aprendizes-de-feiticeiro. Este pseudo-vestibular nacional, chega para ser um requinte a mais na desbragada mercantilização do ensino superior. Nesta se inclui a imensa insensatez da explosão de faculdades picaretas de medicina, e, para maior horror, o vergonhoso colapso do ensino público pré-universitário, estando as nossas antigas escolas primárias à mercê de gangues de pivetes e de livros didáticos alegremente obscenos. Intrínseco a isso, no ensino superior público, o mencionado neo-liberalismo farrista causou e causa o sucateamento físico, docente e moral das universidades - sendo este último só agora noticiado, com vários reitores deslocados, na mídia, das páginas de ciência para as páginas policiais. E, para coroar o descalabro, assistimos atônitos à avassaladora aventura do ensino-à-distância, com todo seu claríssimo potencial de fraude e corrupção. Tanto este como o ENEM e o ENADE estão sendo empurrados goela-abaixo das universidades públicas, a poder de coação e até de chantagem.

Na saúde, somos obrigados a assistir deprimente competição diária por estacionamento, quando as ambulâncias municipais, recém-chegadas de cada cidade do Estado, disputam espaço para descarregar casos não-resolvidos no Hospital das Clínicas. Na outra ponta, nos postos de saúde metropolitanos, prossegue, a cada minuto, o confrangedor desfile de dor, pranto, morte e tumulto nas filas de atendimento. Ao mesmo tempo, os “planos de saúde”, que não são planos e nem são de saúde, faturam milhões e milhões. E não constituem nenhuma assistência suplementar ao SUS, mas sim dispositivos de fato complementares, que estão aderidos ao SUS num abraço letal. Os assessores ministeriais, arrasados por tanta incompetência, paradoxalmente se animam diante das últimas ameaças de epidemia ou se assanham no afã de uma campanha contra isso ou aquilo - na esperança de poder parecer que, pelo menos nesta ou naquela questão conjuntural, se estão saindo bem ou menos mal (mas estão muito mal nos escândalos cumulativos do tamiflu restrito a grupo de risco, do atraso da vacina antigripal e do diagnóstico específico da gripe suína limitado a três centros). Ou então anunciam, como se fosse grande achado inovador, a proibição da auto-medicação com elixir paregórico, com formol ou com antibióticos ou ainda do banho ultravioleta, escondendo do público que qualquer restrição à cobiça infinita da industria de saúde é feita de comum acordo com ela própria, sob a alegação neoliberal de procurar não ofender o mercado.

E, para fechar com chave-de-ouro esse tour maldito de insensatezes, se aferram, com cega obstinação, àquilo que considero a maior cara-de-pau da histórica da medicina. É quando fazem o alerta solene de que, caso algo dê errado, caso o problema persista, que o cidadão procure um médico. De preferência um médico despreparado, formado numa faculdade picareta, que eles próprios acabaram de autorizar

* * *

E O MINISTRO NÃO RENUNCIOU!

O principal do texto acima saiu em meu blogue (jamilcarsalgado.blogspot.com) em 22 de junho de 2009. Diante do que está dito aí, os amigos perguntaram: se isso é fato, será que vai estourar algum escândalo produzido por tanta insensatez? E não é que, no dia 1º de outubro de 2009, a imprensa denuncia a fraude do ENEM, levando à suspensão do pretenso vestibular? A partir daí recebi muitos cumprimentos (sem qualquer alegria minha) pela profecia de junho. Mas o maior escândalo não é a fraude. O maior escândalo é que o MINISTRO NÃO RENUNCIOU. E continua a se exibir na mídia como se a coisa nada tenha a ver com ele! E NINGUÉM ESTÁ EXIGINDO A SUA RENUNCIA!

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

SEBASTIÃO NATANIEL SILVA GUSMÃO

SEBASTIÃO NATANIEL SILVA GUSMÃO

De talentoso nauta de improváveis travessias aos postos máximos da neurocirurgia brasileira e da carreira universitária

João Amílcar Salgado

De todos os extraordinários feitos que eu poderia enumerar como cometidos pelo médico, neurocirurgião, cientista, professor, historiador, inventor e escritor Sebastião Gusmão, prefiro me restringir ao sobredito, ou seja, que ele é em essência um talentoso nauta de improváveis travessias. Sim, sou testemunha de que ele fez heróicas intervenções neurocirúrgicas, coordenou o Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, foi um dos fundadores da Sociedade Brasileira de História da Medicina, inventou aparelho de vivissecção terapêutica do encéfalo, escreveu oito livros, além de três em redação, assumiu há pouco o posto máximo de presidente da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia e assume hoje o posto máximo da carreira universitária, que é o de professor titular de Cirurgia da Universidade Federal de Minas Gerais.

Prefiro, repito, enaltece-lo não por tantas dessas altas e nobres realizações, mas por incríveis diagonais subjetivas e objetivas, vislumbradas por mim em sua originalíssima biografia.

A primeira travessia ocorreu quando emergiu do ventre materno para a luz benfazeja de sua querida cidade de Itamarandiba. O inusitado aí não foi o parto, multíparo que era, mas de ter sido por mão de douto em vez de parteira. Na pequena agenda de Afonso Pavie está lá escrito: hoje fiz o parto da dona Nely, nasceu forte menino que receberá o nome de Sebastião. Isso ligou umbilicalmente o nascituro à França de Pavie.

A segunda travessia consistiu em passar pela ponte estreita entre as linhagens materna e paterna de sacerdotes, ambas pontilhadas de ilustres religiosos, inclusive bispos e cardeal. Pesou mais o lado paterno, atraído à desabusada amplitude intelectual, característica dos Gusmão, comprovada ao longo de séculos. Desde algum Gute Mann godo, até os Bartolomeu, Alexandre, Domingos, Xanana, Abimael e Rivadavia. Amplitude que se desborda mais pela ciência do que pela fé, mais pelo ativismo político do que pelo fervor apostolar, mais pelo cosmopolitismo do que pelo nativismo e mais pelo ecumenismo do que pelo sectarismo.

Mesmo antes de chegar à Capital, protagonizou inédita diagonal dentro da cultura mineira. De Itamarandiba a Pouso Alegre, descobriu as muitas Minas Gerais como realidade una. Era a antecipação do encontro entre dois fraternos amigos, ele e eu, sulmineiro que sou.

A passagem estreita do exame vestibular o conduziu ao contato iniciático com o cadáver. Ele não sabia, mas, na primeira vez em que seu bisturi feriu aquele corpo sem vida, já havia ali a marca da mão cirúrgica do futuro profissional, a qual, no entanto, principalmente em seu caso, era antes de tudo rara mão anatômica - que denominei, quando mais rara ainda, mão vesaliana. Eis outro ponto que nos irmana: a anatomia. Minha turma recebeu, em plenos anos dourados, a maior carga horária anatômica jamais oferecida. Daí passei a coligir tais raras mãos, a começar por aquelas de meus privilegiados colegas-de-turma, hoje astros desta arte, e também seus notáveis mestres formais e informais: Sálvio Nunes, Wellerson Lima, Wilson Abrantes e José Sílvio Resende. Recebemos também o primeiro curso específico de neuranatomia, a seguir transformado em disciplina. Estou assim autorizado a reconhecer no anatomista e neurocirurgião Sebastião Gusmão O PRÍNCIPE DA MÃO VESALIANA NEUROCIRÚRGICA BRASILEIRA.

Para completar sua especialização, auspiciosamente iniciada com seu primeiro mestre José Gilberto de Souza, só poderia dirigir-se à pátria de Afonso Pavie, o aristocrata francês que o partejou e que antes fizera a travessia França-Itamarandiba. Nessa contra-travessia Itamarandiba-França, feita por Sebastião Gusmão, consolidou-se um intercâmbio franco-mineiro anteriormente prenunciado por figuras ilustres de nossa historia, a exemplo dos estudantes de medicina mineiros inconfidentes de Montpellier e de Bordeaux, de Saint-Hilaire, Taunay, Renault, Sigaud, Couy, Peret e outros. Para a primeira guerra mundial, em seu final, o Brasil em vez de com soldados contribuiu com médicos, quando no Hôpital Brésilien, adaptado de um convento, impressionaram os de lá com a habilidade cirúrgica (análoga à do futebol e do samba), depois admirada também na América do Norte.

A seguir, no centenário de nascimento de Pasteur, comemorado a partir de 1922, a maquete de nosso Instituto do Radium foi exibida, com elogios, em Estrasburgo. O cirurgião René Leriche, um dos maiores do mundo, foi convidado a Belo Horizonte onde operou no mesmo Instituto. Com isso, as duas maiores expressões da cirurgia francesa, Leriche e Victor Pauchet, um professor em Estrasburgo e outro nascido em Amiens, estabeleceram relações com Minas, o primeiro por meio de Borges da Costa e o segundo por meio de Afonso Pavie, seu conterrâneo, seu ex-colega de curso médico e seu maior amigo. Por sinal, Costa e Pavie, ao lado de Hermenegildo Vilaça, são iniciadores da cirurgia moderna em Minas. Mais tarde, na gastroenterologia, floresceu belo intercambio entre o scolar Henri Sarles, de Marselle, e uma plêiade de médicos mineiros.

Quando Sebastião Gusmão foi especializar-se em Estrasburgo, renovou multiplicadamente essa múltipla ligação entre as medicinas francesa e mineira. E esta foi reforçada por luminosas amizades entre o brasileiro e dois imponentes vultos da neurocirurgia francesa: Daniel Maitrot de Estrasburgo e Pierre Galibert de Amiens – ambos devotados admiradores tanto do amigo como de Minas e do Brasil. Pelo serviço que Gusmão prestou à comunidade de Amiens, revelando-lhe a façanha tropical de Pavie, concederam-lhe o título de Doutor Honoris Causa da Universidade local

Intercâmbio igualmenate incomensuravel estabeleceu Sebastião Gusmão com outro luminar da cirurgia neural, o curdo Mamude Gazi Yasargil. Operando na Suíça, ele criou a microcirurgia encefálica, pelo que foi eleito o homem do século 20 da neurocirurgia mundial. Ele mantém comovente afeição a seu discípulo brasileiro e também à cidade de Ouro Preto. Atualmente, nos EUA, com 85 anos, ainda opera diariamente, mantendo-se ativo graças ao regime de comer maçã a cada meia hora, hábito de seu povo. Palavras semelhantes eu teria para outros amigos ilustres do Sebastião, espalhados pelo mundo, em virtude de um sem número de frutíferas travessias, do Japão às Américas. Todos estejam representados aqui pelo maior especialista em migração lusa ao Brasil, o bracarense Miguel Monteiro, recentemente falecido, a quem ora homenageamos muito saudosos, ainda mais que por certo viria a esta festa.

Nenhuma dessas sumidades, que tive o prêmio de conhecer, graças a meu convívio com o Sebastião, se iguala, no mais fundo de meus sentimentos, a seu pai, o sertanejo Sêo Nozinho, vernaculamente Natan Gusmão. Muito me orgulho de que Sêo Nozinho me tratava não como o intelectual que sou, mas como um dos demais fazendeiros de Itamarandiba, fazendeiro que sou de Nepomuceno. Conquistei-o quando me reconheceu amador igual de muitas das coisas que ele amava. A primeira delas foi a divina leitoa que a dona Nely nos serviu em minha primeira visita. Ela própria fez questão de dizer que meu elogio foi o maior, e garanto justo, que jamais recebera por suas muitas habilidades culinárias. E os causos com que o Sêo Nozinho e eu nos entretínhamos por horas a fio, se escritos, ameaçariam o famigerado autor Guimarães Rosa.

Certa vez cheguei a sua gostosa residência, junto a essa gente tão irmã, e, já no meio daquele abraço de matar saudade, Sêo Nozinho já foi adiantando que lembrara de algo que muito me interessaria. Ele queria contar que seu pai, Herculano, e seu avô, Joaquim, clinicaram como carimbambas naquela região por longos anos, auxiliados por um manual de Chernoviz. Só essa notícia já era fundamental para atestarmos o pendor hereditário do médico Sebastião Gusmão. Mas o que Sêo Nozinho acrescentou foi muito mais impressionante, precioso e significativo. Era que seu avô Joaquim Gusmão acabou sofrendo um derrame e perdeu a fala, mas não a escrita. Sendo ele insubstituível, o povo ficou aliviado quando soube que ele podia continuar atendendo a todos, usando apenas a escrita. Mas Seo Nozinho ressaltou: que os clientes não insistissem para que ele dissesse algo, pois de seu antigo e quase sempre educado vocabulário só lhe restou um palavrão.

E foi então que o Sebastião e eu verificamos que a época desse fato foi a mesma em que o notável neurofisiologista francês Pierre Broca descreveu o local cerebral da fala humana, em um paciente vítima aparente também de um derrame. Se instado a falar, o gaulês emitia sempre um esboço de palavra que ficou eternizada em várias línguas: tantan. Assim o palavrão brasileiro e o tantan relatado por Broca passaram a ser mais uma das misteriosas diagonais traçadas pelo argonauta Gusmão, em sua esplendente vilegiatura pela vida, pela ciência e pela cultura.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

NEPOMUCENO
De como esta cidade está no mapa sentimental de Minas
João Amílcar Salgado
Qualquer observador já se encantava por Minas Gerais mesmo antes de 1700, sobretudo pela paisagem. Após essa data, houve a gradativa sedimentação do espírito mineiro e os visitantes mais ainda se fascinavam, desta vez tanto pela paisagem como pelo modo mineiro de ser. Ainda no século 18, um minerador, depois de viver feliz e enriquecer aqui, concluiu que D. João V, rei de Portugal, seria muito idiota se não transferisse a sede do reino para esta província. O próprio Tiradentes também disse, é claro que pensando em Minas: se todos quisessem, poderíamos fazer do Brasil uma grande Nação.
O medo de isso acontecer fazia tremer aqueles que levavam daqui enorme quantidade de ouro e gemas. Tanto que impediram o acesso de Minas ao Atlântico. Hoje se sabe que, se tivéssemos mar, seria inevitável nossa independência, muito antes de 1822. Já no século 19, um engenheiro inglês, depois de percorrer Minas Gerais, propôs que o Império Britânico usasse de seu poderio para anexar a seus domínios esta encantadora região. Curiosamente acrescentou que, caso isso fosse feito, os novos donos teriam muito trabalho em moldar o jeito tranqüilo de nossa gente ao estilo enérgico necessário à exploração de tão maravilhosas riquezas.
Estudo o fato de que a cultura mineira contém virtudes únicas que a fazem ultrapassar generosamente as fronteiras de nosso Estado. Por outro lado, o GRANDE SUL DE MINAS compreende as águas vertentes descidas do norte até o Rio Grande e ao mesmo tempo engloba toda a chamada Zona da Mata Mineira. Quem forçou a Zona da Mata a separar-se do Sul de Minas foi gente traidora de Minas. Isso acabou inibindo a precedência juizforana na industrialização brasileira, inclusive causando a localização fora de Minas da usina de Volta Redonda, a primeira siderúrgica do país. E, para que esta produzisse aço, cinicamente vinham buscar o minério em Minas.
Todo esse preâmbulo é para ressaltar os privilégios de Nepomuceno, localizada a igual distancia dos três maiores centros metropolitanos, no coração da área mais desenvolvida do país. E estamos vivendo um tempo em que o Brasil, apesar de muitos obstáculos, está em vias de se tornar a quinta nação mais rica do mundo, como profetizou o estadista Tiradentes, há 220 anos atrás. Além dessa singularidade geopolítica, contamos com inestimável privilégio histórico. Nepomuceno situa-se bem perto da Estrada Real, tanto é que a rodovia Fernão Dias, quando ainda era de terra, passava por aqui, contornando a igreja Matriz, subia a Rua Rubem Ribeiro e saía pela Rua Ana Idalina. Esse caminho, entre a cidade de Parati e Sabará, foi chamado de Caminho Velho e foi usado de 1674 até 1710, quando, para o escoamento do ouro, foi substituído pelo Caminho Novo, entre o Rio de Janeiro e Vila Rica. Antes, entretanto, de 1710, o Caminho Velho já era uma rede de caminhos e o trecho próximo a Nepomuceno passou a ser cada vez menos usado, pois os viajantes passaram a desviar-se na hoje cidade de Cruzília em direção a São João Del Rei.
Depois de 1710, havendo menos pressa para chegar ao ouro de Sabará e Vila Rica, caçadores de ouro, entre eles os próprios parentes de Fernão Dias, apelidados de os Bueno da Fonseca, esquadrinharam o Caminho Velho. Acharam, pouco antes de 1737, boa quantidade de ouro nas imediações de um afunilamento das águas do Rio Grande e ali passaram a lavrar essa riqueza. O lugar passou a ser chamado de Lavras do Funil e nesse funil foi construída, há pouco tempo, uma usina hidrelétrica.
É claro que também deduziram haver ouro nos afluentes do Rio Grande, nas imediações do garimpo inicial, e uma das lavras foi estabelecida no rio do Cervo, entre as pedras de uma corredeira hoje chamada Banho - que pode designar tanto banho de gente como banho de cascalho. Um dos que mais tarde ainda lucraram com o ouro dali pode ter sido um mulato hábil no trato desse metal, chamado João Inácio Dias, que passou a residir no povoado próximo ao Banho. O povoado veio a ser a cidade de Nepomuceno e nele surgiu a Rua Nova onde eram encontrados os artífices do lugar: carpinteiro, tintureiro, músico, ferreiro, ourives, barbeiro, alfaiate, açougueiro, padeiro e outros. Hoje a Rua Nova tem o nome do ourives João Inácio Dias, de quem descende uma das mais queridas famílias nepomucenenses.
Quando eu era criança e passava as férias na Trumbuca, achei debaixo de enorme pé de jatobá, que declarei ser meu, vários instrumentos de pedra dos antigos índios. Maravilhado e sentado naquela sombra, ficava a imaginar como era a vida deles ali antes da chegada dos portugueses ao Brasil. Mais tarde fui visitar o local onde existiu o quilombo da Bárbara e passei a estudar seu povo, especialmente seu último líder, o Lolão. Hoje investigo os demais quilombos: Retiro, Calunga e Bacia, que seriam quilombos-sentinelas do grande Quilombo do Cascalho, entrincheirado na Serra das Três Pontas. Os índios daqui (cataguás?, puris?, caiapós?, cambuavas?, garanguis? trumbucas?) e os quilombolas foram os primeiros e mais autênticos nepomucenenses. É nosso dever levantar o máximo possível de sua história, inclusive a violência de que foram vitimas. Alguns nomes de lugares que retratam esse passado são cheios de poesia, de sugestões, ou de interrogações: Ermo, Contendas, Vinte-Horas, Quatis, Morembá, Repolho, Cabeças, Arranca-Rabicho, Limeira, Paineiras, Coqueiros, Pinhal, Piraquara, Bocaina, Esmeril, Cascavel, Carrapato, Queima-Capote, Desidério, Sapé, e Sapecado.
Antes da chegada das plantações de café a Nepomuceno, a economia girava em torno da produção vegetativa de madeira, gado, banha, açúcar e cachaça. Como tudo era de baixa produtividade, as fazendas tinham de ser muito grandes para acudir famílias de muitos filhos. No início, os casamentos entre primos e até entre tios e sobrinhos amenizavam a redução das propriedades. Mas, no século 19, foi inevitável a diáspora de herdeiros que se dirigiram ao oeste, onde era possível a posse gratuita de terras e o desenvolvimento, com pouco capital, de novas fazendas gigantes. Daí que as famílias iniciais de Nepomuceno e região hoje contam com parentes no oeste de Minas, no Triângulo, no noroeste paulista, em Goiás e em Mato Grosso. Por exemplo, fundadores das cidades mineiras de Uberlândia e Ituiutaba, bem como da cidade goiana de Mineiros, são relacionados à família Alves Vilela de Nepomuceno. Os fundadores de Mococa e Casa Branca em São Paulo são relacionados a nossos Garcia, Figueiredo e Lima. Um parente dos Pereira de Nepomuceno fundou Bauru e consangüíneos de nossos Junqueira, Diniz e Antunes fundaram Franca, ambas importantes cidades paulistas. Um recente governador de Goiás, Maguito Vilela, é neto de um Figueiredo Vilela de Coqueiral.
Os povoados de Lavras e de Nepomuceno surgiram de motivos diferentes. O de Lavras nasceu de uma capela, hoje a Matriz da cidade. Gente que não se dava com o tumulto do garimpo do Funil originou um povoado a certa distância dali. Luiz Gomes Salgado, o dono das terras desse local, decidiu construir uma capela em louvor de Santa Ana, autorizada em 1751. O patrimônio doado por ele eram umas capoeiras nas vizinhanças da dita capela, isto é, o atual centro urbano de Lavras. Os descendentes de Luiz Gomes Salgado, fundador de Lavras, hoje são os admirados nepomucenenses da família Teófilo Salgado.
Já o povoado de Nepomuceno surgiu da fazenda do Congonhal, ainda hoje existente, mas sem o casarão primitivo. Os escravos e agregados da fazenda habitavam um arruamento, hoje rua Mariana Januária, que ligava o casarão até o local onde foi erguida uma capela, hoje a Matriz, em louvor de São João Nepomuceno. Nessa época disseminou-se pelo mundo o culto a este santo que viveu 300 anos antes. O fervor foi tão grande que seu nome foi dado a lugares, pessoas e até a navios. O dono da fazenda Congonhal era Mateus Luiz Garcia e o povoado surgido de sua fazenda veio a ser distrito de Lavras, mais tarde promovido a Vila de Lavras. Daí que até hoje o povo de Nepomuceno chama sua cidade de Vila. Ainda agora a fazenda do Congonhal pertence a familiares de Mateus, no caso os filhos do estimado casal João e Vera Veiga.
A maioria das terras da cidade de Nepomuceno, entretanto, não pertencia aos Garcia, mas compunha a imensa propriedade de Vicente Ferreira Costa, o célebre sesmeiro capitão Vicente, da Fazenda da Lagoa. Mateus e Vicente eram capitães. Ser capitão nessa época, antes da Independência, era muito mais do que coronel depois desta. A família Garcia/Figueiredo/Vilela era oriunda de imigrantes açorianos e a família Costa/Salles/Pádua era de ascendência bandeirante. O latifúndio do Capitão Vicente chegava perto da sede da Fazenda do Congonhal. Separando as duas propriedades, passava a Estrada Boiadeira, hoje Avenida São João (uma das ramificações do Caminho Velho). Os familiares do Capitão Vicente reivindicaram que uma faixa abaixo da Estrada Boiadeira era ainda de seu domínio, daí que a rua abaixo da Estrada, apelidada de Rua dos Tocos, passou a ser oficialmente denominada Rua Francisco Lima, herdeiro de Ferreira Costa - mas o povo prefere chamá-la Rua das Árvores. Chamam-na assim por ser a única arborizada, em comparação com as outras três primeiras ruas da cidade: Rua Mariana Januária (de ir à capela), Rua Direita (do comércio, hoje Ernane Vilela), Rua Nova (dos artífices, hoje João Inácio Dias).
Por falar em árvores, Mateus Luiz Garcia, fundador de Nepomuceno, deve ser considerado pioneiro do movimento ecológico mineiro e brasileiro. Os comerciantes da praça principal de Lavras queriam derrubar as belas árvores ali existentes, por cobiça financeira. O povo se opôs. Para garantir a derrubada, os malvados contrataram a proteção de Januário Garcia, o homem mais temido em Minas, por andar com um colar de sete orelhas, retiradas de sete irmãos, assassinos de seu irmão. As árvores não foram abatidas e algumas ainda estão lá para orgulho de lavrenses e nepomucenenses, bem como para a apreciação dos turistas. Quem foi o defensor vitorioso das árvores foi o primo de Januário, nosso Mateus Luiz Garcia. Na praça, diante deste, o temido Januário Sete Orelhas, segundo a tradição oral, teria dito: sei que o primo Mateus não é capaz de pisar numa formiga, mas taí um homem que não enfrento de jeito nenhum...


O autor é professor titular de Clínica Médica e pesquisador em História da Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais.
É também historiador do Sul de Minas e autor do livro de memórias O RISO DOURADO DA VILA, 2003.
Este texto, com ligeiras modificações, corresponde ao discurso proferido pelo autor, como orador oficial no 99º aniversário da cidade de Nepomuceno, em 29/08/010

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

terça-feira, 24 de agosto de 2010

DISCURSO DE POSSE DE JOÃO AMÍLCAR SALGADO, COMO MEMBRO HONORÁRIO DA ACADEMIA MINEIRA DE MEDICINA. BELO HORIZONTE, 10-08-010

Que honra é esta, se sou apenas um pobre homem do caminho velho das Minas Gerais?

Precolenda mesa, composta de doutos representantes da comunidade médica e de seletas expressões da sociedade mineira. Saúdo cada qual, na pessoa do presidente Gilberto Madeira Peixoto. Saúdo Valênio Perez França e Marie Louise Stein, os grandes ausentes de hoje. Saúdo a minha turma de 1960, que neste ano aniversaria os seus 50 anos.

Por favor, do alto de seus cabedais, atinem com algo paradoxal. Sua generosa presença e o simpático comparecimento de todos, amigos e familiares, prestigiam um ato ao mesmo tempo honroso e embaraçoso. Sim, esta obsequiosa investidura perturba e embaraça minha modéstia caipira. Nesta circunstancia, o desembaraço só é possível se devolvo a distinção a quem me trouxe até aqui. A começar por meu fraterno companheiro desde a infância: o hoje eminente infectologista pediátrico Edward Tonelli.

Entre tantas e tão precoces titulações, sintetizo-as numa só, que ficará na história e que nos bastaria a nós outros: Tonelli é um dos heróis internacionais da luta anti-pólio. Nós dois somos tão irmãos que seu pai, o inesquecível Zico Tonelli, figura na capa de meu livro de memórias. João Batista Tonelli, o Zico Tonelli, e meu pai, o João Sargado, que era assim chamado, foram o principal alfaiate e o principal farmacêutico de nossa cidade de Nepomuceno. Ali, gastavam boa parte de cada dia a pregar peças um no outro. E também a discutir gravíssimas questões de futebol.

João Salgado Filho, meu pai, foi farmacêutico, professor de colégio e poeta, precisamente como Carlos Drummond de Andrade. E mais: foram contemporâneos no curso de Farmácia em Belo Horizonte. Drummond deixou Itabira e se federalizou, tornando-se poeta transnacional. Meu pai ficou em Nepomuceno, para praticar o humorismo, criando poemas e pomares. Tendo falecido cedo, forma com Belmiro Braga, Dantas Mota, Vinícius Meyer e outros a categoria que chamei de poetas municipais. Eles agitaram boa parte da cultura mineira no século 20. É tema que estudo com carinho e com o indispensável apoio da querida escritora Leila Fonseca Barbosa, sobrinha-neta de Belmiro Braga.

Meu avô, João de Abreu Salgado, compõe o grupo peculiar de educadores que se formaram normalistas no início do século 20. Estudaram, na mesma escola normal de Três Pontas, ele, Samuel Libânio (um dos fundadores de minha Faculdade de Medicina), Carlos Caiafa (pai), Pimenta da Veiga (pai) e outros. João de Abreu Salgado é o primeiro e principal biógrafo do beato Padre Vítor – o santo sacerdote negro do Sul de Minas. Abreu e Caiafa, tão amigos, não sabiam (ou sabiam?) que seriam bisavós dos mesmos bisnetos, Carlos Amílcar e João Vinícius, meus filhos.

Fui avisado de que o membro honorário da Academia não tem patrono. Então peço licença para transformar tal impedimento em permissão. Unilateralmente permito-me designar não um mas mais de um patronos virtuais: o próprio Edward Tonelli e aqueles outros queridíssimos amigos, representados por Arnaldo Antônio Elian, Fernando Araújo, Luiz de Paula Castro, Wilson Luiz Abrantes, Hélio Lopes, Márcio Ibraim de Carvalho, Márcio José de Castro e Silva, Pedro Raso, Nassim da Silveira Calixto, Carlos Alberto Barrros Santos, Jairo Carvalhaes Câmara, Cláudio Azevedo Sales (que me brindou com o transporte até esta solenidade, num dos sofisticados automóveis de sua coleção) e Ernesto Lentz, este meu dileto colega de turma desde os bancos do Colégio Estadual. São os muitos que muito insistiram para que eu aqui chegasse. Entre todos, sublinho dois, que cometeram o exagero de indicar-me como seu sucessor: Pedro Salles, o notável historiador da medicina brasileira, e José de Noronha Peres, o primeiro grande virologista deste país. Do apelo de Salles, a filha Adélia, também escritora e historiadora, prosseguiu na convincente ressonância, em mais que evidente prova de nossa duradoura amizade. A eles acrescento Javert Barros, o primeiro radiologista eleito paraninfo, exatamente em minha formatura e a quem saudei como orador da turma de 1960.

Proclamo também meus patronos os grandes médicos da historia mineira cuja obra estudei. Tenho-os em minha admiração mais enternecida. Certo seria citá-los e também seus feitos, mas a lista é longa. Vou representá-los por um grandioso trio científico: Vital Brasil, Carlos Chagas e Wilson Beraldo; e uma invejável trindade literária: Agripa Vasconcelos, Pedro Nava e Guimarães Rosa.

Vital Brazil Mineiro da Campanha foi batizado assim com estas palavras. Foi o demonstrador internacional da eficácia do soro antiofídico, desautorizando gigantes da ciência. Desde menino, eu o achava parecido com meu avô, seu parente. Sofreu há poucos dias segunda morte com o incêndio irresponsável do Instituto Butantã, obra tão sua, à qual mesquinhamente não quiseram dar seu nome.

Carlos Ribeiro Chagas - este jamais distinguiu a pesquisa laboratorial da investigação de campo e nem estas duas da pesquisa clinica. Por não distingui-las, estava capacitado a fazer a inigualável descoberta que fez, revelando ao mundo a doença que traz seu nome. Trata-se de descoberta processada com esmagadora elegância. Revelou o tripanosoma causador e deste chegou à doença aguda. Desta subiu às formas clínicas e enfim à profilaxia. Esse modo de descobrir era e é inédito, pois é inverso às demais descobertas de doença, em toda a historia da medicina. Primeiranista, li o louvor à peculiaridade de sua façanha, nas palavras enfáticas de um parasitologista norte-americano. Isso me fez forte emoção, que cresceu quando me lembrei de que ele nasceu ali mesmo na Fazenda Bom Retiro, na cidade de Oliveira, não muito distante de onde nasci. Daí que decidi seguir seu exemplo. E de fato minha atividade de pesquisador foi propositalmente exercida no laboratório, em meio a animais experimentais, e no campo, em meio a cafuas e insetos, tanto quanto na clínica ambulatorial e hospitalar. Tal inspiração foi recompensada por meu afortunado encontro com a paciente Berenice. Dela extraí, em 1961, o mesmo micróbio que Chagas identificara em 1909.

Wilson Teixeira Beraldo, autor, com colaboradores, da segunda maior realização da ciência brasileira, a descoberta da bradicinina – é uma das mais fascinantes figuras humanas em minha lembrança. Com ele sucedeu que, na publicação que anunciou a descoberta, seu chefe apareceu em primeiro lugar na lista de autores. Este fato é comum em publicações científicas, mas aqui serve para homenagear João Galizzi, meu chefe. Na publicação do reencontro da paciente Berenice, colocamos seu nome em primeiro lugar. Pois bem, ele não só exigiu que meu nome fosse o primeiro (eu era um recém-formado de 24 anos) como deslocou o seu para o final, na seqüência de co-autores.

Por favor, atentem para algo que nos deve causar nobilitante e estremecido orgulho. Esta monumental e inimitável galeria médica é patrimônio de um Estado, Minas Gerais, cuja história colonial começou 200 anos depois do resto do país! Tudo isso será mais admirável ainda se fizermos um acréscimo. Além das façanhas científicas citadas, é também mineira a maior realização tecnológica brasileira: o conjunto de invenções de Santos Dumont.

E a trindade das letras nada fica a dever aos cientistas. Agripa Vasconcelos é aquele que, em narrativas romanceadas, buscou retratar a essência de nossa identidade. É o mesmo objetivo que tiveram Nava e Rosa por outros meios. Pedro Nava, em sua busca, se fez o maior memorialista lusófono. Guimarães Rosa, em sua inquietação, se tornou o mais criativo prosador da língua portuguesa.

Cismei que cabia a mim, incapaz de obra semelhante, acrescentar modesto complemento ao que realizaram. É o que resumo a seguir.

Para isso, lembro a exclamação inicial que fiz. Donde ela surgiu?

Estava eu sentado diante de Pedro Nava, no Centro de Memória da Medicina de Minas Gerais, em nossa primeira conversa. Observei-lhe: você, no livro Baú de Ossos, disse que era um pobre homem do caminho novo. Ele respondeu, sorrindo: disse e sou... Emendei: pois você, que é do caminho novo, está falando com um pobre homem do caminho velho. Este simples paralelismo em nossa origem nos fez amigos imediatos.

E passamos a comparar os dois caminhos. Falei que de fato sou do caminho velho, num ponto que fica um pouco a oeste da cidade de Ibituruna. Esta foi o primeiro aldeamento não-indígena nesta Província.

Não é de agora que busco a essência mineira nas obras de Pedro Nava, Guimarães Rosa e Agripa Vasconcelos. Este diplomou-se no Rio. Rosa foi contemporâneo de Nava em nossa Faculdade e é omitido sistematicamente por este. Adiei falar-lhe sobre isso e fiquei sem suas razões. De qualquer modo, importa é o caráter mineiro. A paisagem dos caminhos de Minas indica que este se vem prefigurando em pedra há milhões de anos. Duas muralhas, a do Mar e a da Mantiqueira isolam esse jardim brasileiro e sua gente. Os rios completam a obra, pois se ensimesmam em seu fluxo. O Grande, em vez de ser irmão do Paraibuna, se interna rumo oeste. O Sapucaí e o Verde, em vez de irmãos dos Mogis, descem rumo norte; e acumulam uma das mais espessas camadas de húmus do planeta. São imitados pelo São Francisco, pelo Paraopeba e pelo Guaicuí. Estes, em vez de afluir tributários do próprio Grande, preferiram compor tropelias de águas em imenso sertão. E é um sertão tão grande que afinal exigiu três gigantes das letras para caracterizá-lo: o sertão de Afonso Arinos, o grande sertão de Rosa e os sertões de Euclides.

Essa opção pela interioridade sertaneja está, pois, esculpida na própria paisagem física. E veio fazer esplêndido arco gótico com igual interioridade na paisagem humana. Arrefecida a corrida pelo ouro, os que aqui habitavam e não foram mortos se somaram aos que aqui chegaram e gostaram de aqui ficar. Estes sim e não os outros vieram a se definir como os autênticos e radicais mineiros.

Configuramos milagrosa mentalidade convergente. A ela dei o nome de tríplice inclinação totêmica: dos tapuias americanos, dos celtas europeus e dos bantos africanos.

Sim, Minas nasceu totêmica. É filha direta do totemismo tapuia, co-extensivo aos antecedentes andinos da religião aimará. A volúpia do ouro quase nada deixou da língua, da religião e dos costumes tapuias, exceto o pejorativo de suas botocas, a mentira de seu canibalismo e as arengas contra sua sublime insubmissão – propalados por seus genocidas. Há 200 anos vasculhamos seus vestígios culturais, que, infelizmente remontam a quase só ossos, principalmente os desenterrados por Lund e as feições surpreendentes de Luzia.

Minas nutriu-se a seguir do totemismo céltico-galego. Este nos veio da predominância minhota em nosso componente luso. Contrariando a tendência na Eurásia, o totem celta tem por referencia não o velho salvacionismo oriental, mas os mistérios brácaros do Ocidente.

No extremo noroeste ibérico, os celtas se compraziam no jogo de divisar a Ursa Maior, para, dela achar a Ursa Menor e na cauda desta identificar a estrela polar, astro guia, indicador do Norte, garantia fiel do retorno ao lar. O espaço legendário dessa estrela resultou no campus stellae, que é o campo-estrela ou a campo-estela ou Compostela. Enquanto isso, nós aqui em Minas - filhos de minhotos e netos de galegos – persistimos, mesmo inconscientes disso, num eterno peregrinar, no mesmo rumo.

Notável é que um poema totêmico de Minas, aquele que louva a Bárbara bela, e que a diz ser do Norte estrela – acabou-nos servindo de evocação à mensagem libertária da Inconfidência.

Ora, essa gente, que é a maioria de nós e que não tem mar, foi no mar curtida. De tanto se aventurar em ignotos oceanos, perdeu a sobriedade - e adquiriu o vicio da embriaguês das ondas. Em Minas, privada da imensidão atlântica, o espírito argonauta em nós achou de vir navegar quer as ondas encapeladas das serranias mineiras, quer os doces alísios de nossos congonhais.

Enfim, a mentalidade mineira adquiriu vigor no totemismo banto. Este está incrustado na predominância sul-africana daqueles que escravizamos; principalmente das mães-de-leite em quem amamentamos. Ele chegou aqui por uma razão muito especial. Justo porque entre os bantos havia mineradores. E havia também as belas e meigas escravas cabindas, aquelas que os senhores-de-engenho do norte não conseguiam comprar, mas os senhores–do-ouro do sul podiam pagar. Seu totem se relaciona ao monoteísmo núbio e deste se vincula ao monoteísmo histórico. Daí que o congado de nossa infância pode ser visto como o reencontro em Minas de gente da África com a evolução do monoteísmo. Este foi inicialmente totêmico entre os núbios e, via Egito, foi levado ao Mediterrâneo, trampolim que o fez circundar o mundo.

Para terminar, voltemos a Pedro Nava.

Antes de sua morte, escrevi um trecho que prometera a ele e não cheguei a enviar-lhe. Nele digo o seguinte.

Muitos dos ascendentes de nós mineiros decidiram passar além da dor e ultrapassaram o Bojador. Assim, do mar salgado, muito do sal são lágrimas de nossos ancestrais. Por cruzá-lo, muitos de nossos avoengos choraram e muitos em vão rezaram. Quantas noivas ficaram por casar, para que aquele mar fosse um mar também dos mineiros! E esse mar não é o simples mar Atlântico. Este tem fim. O mar com fim é dos outros. O mar sem fim é o mar lusitano, e portanto mineiro também. Valeu a pena? Não, não valeu, pois inventaram o Estado do Espírito Santo e nos privaram desse mar salgado, tão nosso! Por isso é que o rio Doce, qual indignado e indomável aimoré, não quis fazer companhia ao Grande e ao São Francisco. Preferiu invadir o Espírito Santo para nos devolver o mar sem fim de Fernando Pessoa.

Muito obrigado.


quinta-feira, 24 de junho de 2010

INCÊNDIO NO BUTANTAN, SEGUNDA MORTE DE VITAL BRASIL

João Amílcar Salgado

O incêndio ocorrido no Instituto Butantan, em 15 de maio de 2010, deve ser considerado a segunda morte do cientista mineiro Vital Brasil. Tal desastre significa que, desde o falecimento de Vital Brasil em 1950, uma das partes mais expressivas de sua produção científica, que é a coleção de animais peçonhentos iniciada por ele, ficou grave e irreversivelmente danificada, em virtude do descaso com que vem sendo tratada por décadas. Esse descaso é coerente com o menosprezo por sua memória pessoal, tanto por parte de cientistas como de historiadores.

De fato causou pasmo generalizado saber da inconcebível falta de condições de proteção ao acervo incendiado. Isso, se somado à recente (final de 2009) denúncia de corrupção no Instituto, é mais espantoso ainda, multiplicando as dimensões da ofensa à memória de Vital Brasil. Sob o fogo, milhares de exemplares de serpentes, aranhas e escorpiões foram perdidos em condições irremediáveis. As chamas começaram entre sete e oito horas da manhã e às dez horas, inexplicavelmente, nada pôde ser feito para proteger a inestimável coleção. Como sempre, logo depois, gente encarregada de minimizar os efeitos políticos do escândalo veio dizer que a coisa não teria sido tão grave assim.

Quanto à corrupção no Butantan, não se pode saber quando começou, pois desde 1985 a administração é a mesma. Segundo a imprensa paulista, pelo menos 35 milhões de reais saíram da fundação para empresas e destas para funcionários. Uma companhia de manutenção de equipamentos é acusada de ficar com 24 milhões. A quadrilha teria feito depósitos que, segundo a direção empresarial, não eram do conhecimento desta. Os desvios podem chegar a cem milhões.

Diante disso uma pergunta é imediata: que segurança podem ter os produtos bio-farmacêuticos destinados a milhões de brasileiros? A dúvida sobre descuido, desvio e falsificações dos respectivos insumos se impõe de pronto. Para aumentar tal desconfiança, lembramos que, na epidemia de gripe suína do ano precedente, houve generalizada decepção em relação ao que se esperava do Instituto Butantan. Se não há segurança contra o fogo e contra o desvio de recursos, como confiar nas vacinas ali produzidas e na capacidade da instituição para futuros desafios sanitários?

O Instituto Butantan começou muito bem com Vital Brasil. Deu passos duvidosos desde que o criador mineiramente julgou que era a hora de ausentar-se. Deixou sua criatura para que outros nela procurassem servir à ciência tanto como ele, permitindo até que se assenhoreassem do que era intransferivelmente dele. Ele, que derrotou o ofidismo, teve de engolir sapos (entre estes até a sórdida acusação de mercenário), em favor da sobrevivência da ciência, a partir do ponto a que chegou. Tanto sacrifício terá valido a pena? Agora sofre outra enorme agressão. Sim, um óbito adicional lhe é infligido, quando fatos e denúncias passam a manchar lamentável e indelevelmente a parte que lhe cabe da ciência brasileira.

O ano de 2009 foi o ano da comemoração do centenário da maior realização da ciência brasileira: a descoberta da doença que traz o nome de seu autor, o mineiro Carlos Chagas – a quem, por vilania inconcebível, foi retirado o prêmio Nobel de 1921. Já 2010 é o ano em que mais um cientista mineiro, Vital Brasil, é vitimado. Vergonhosa desídia impõe-lhe segunda morte, sob o impacto de escândalos financeiros somados a escandaloso incêndio. Que lástima contemplar hoje assim o Instituto centenário, criado por ele, com desprendimento e heroísmo!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

FRANCISCO DE MELO FRANCO

Do sertão de Paracatu a astro europeu

João Amílcar Salgado

Nasce em Paracatu, Minas, em 1757. Admitido em Medicina em Coimbra em 1776. É acorrentado por quatro anos pela Inquisição, acusado de irreligiosidade. Retoma o curso em 1782. Escreve sátira contra a Universidade em versos perfeitos, intitulada O REINO DA ESTUPIDEZ (1785), que causa a substituição do reitor. Diplomado em 1786, casa-se com a mulher antes presa com ele como testemunha de acusação. Torna-se médico famoso e rico. Empresta e perde toda a sua considerável fortuna. Como médico da corte, acompanha a princesa Leopoldina ao Brasil. No Rio é ignorado, fica doente e vai para São Paulo, onde tem parentes e é ridicularizado por propor a novidade da vacina contra a varíola. Resolve voltar a Portugal, mas, pressentindo que não suportaria a viagem, pede para desembarcar perto de Ubatuba e morre solitário numa palhoça caiçara, em 1823.

Na masmorra escreveu os poemas NOITES SEM SONO (1781) e depois a sátira citada. A seguir: RESPOSTA AO FILÓSOFO SOLITÁRIO 1 e 2 (1787), TRATADO DA EDUCAÇÃO FÍSICA DOS MENINOS PARA USO DA NAÇÃO PORTUGUESA (1790), MEDICINA TEOLÓGICA (1794), OPÚSCULOS SOBRE A VACINA (1814) e ENSAIOS SOBRE AS FEBRES (1824). O eminente pediatra mineiro Martinho da Rocha (no livro NOSSO PRIMEIRO PUERICULTOR (1946)) o proclama pioneiro mundial em puericultura, com seu Tratado de Educação Física. Assim, dá início ao brilho da pediatria de Minas que passa pelo mesmo Martinho e prossegue com Álvaro Aguiar, Valter Teles, Leonel Gonzaga, Navantino Alves, Edward Tonelli, Archimedes Teodoro, José Geraldo Leite Ribeiro, Paulo Pimenta de Figueiredo, Luciano Peret Filho, Antônio Márcio Lisboa, Leonardo Falci Mourão e outros, culminando com o feito da maior carga horária pediátrica do mundo, inspirada no carisma de Ênio Leão, adotada na reforma do ensino de 1975, na Universidade Federal de Minas Gerais.

Estudiosos indicam que, na Medicina Teológica, Francisco de Melo Franco antecipa idéias de Freud. Como especialista em pedagogia médica, o proclamamos primeiro grande pedagogo médico brasileiro, por sua sátira ao ensino coimbrão. Nesta área foi o dianteiro de outros mineiros, como Antonio Gonçalves Gomide, Antonio da Silva Melo e contemporâneos, que dão primazia a Minas no ensino médico. É também vanguardeiro de um rol de médicos mineiros, notáveis como escritores (poesia e prosa): o mesmo Silva Melo (cintilante polígrafo), Pedro Nava (o maior memorialista lusófono), Guimarães Rosa (o mais original prosador do idioma), Paulo Pinheiro Chagas (invejável orador e escritor), João Antônio Avelar (criativo escritor, teatrólogo e humorista) e outros.

APRESENTADO NO 23º CONGRESSO NACIONAL DA SOBRAMES, EM OURO PRETO, JUNHO 2010

MACHADO DE ASSIS E BELMIRO BRAGA

João Amílcar Salgado

Entre os múltiplos aspectos biográficos de Machado de Assis, não pode deixar de ser lembrada a admiração que o poeta mineiro Belmiro Braga dedicou ao escritor carioca. O próprio livro de memórias de Belmiro Braga traduz essa admiração no título: DIAS IDOS E VIVIDOS, derivado do célebre soneto de Machado à esposa Carolina.

Belmiro, um simples balconista do interior mineiro, acompanhava tudo sobre Machado, inclusive a data de seu aniversário. Em 1891 não resistiu ao impulso de ousar cumprimentá-lo por meio de uma carta e um poema, enviados para chegar antes do natalício, 21 de junho. Talvez o missivista fosse a única ou das poucas pessoas a lembrar-se da data. Isso pode ter sensibilizado ainda mais o esplêndido prosador, desencadeando sincera admiração mútua.

Os delicadíssimos versos que acompanhavam a carta começam assim: “Quando ela fala, parece / que Deus é que anda a escutá-la. / A natureza emudece, / quando ela fala.” Em 24 de junho, Machado responde: “Meu caro poeta. Recebi e agradeço-vos muito de coração a carta ....” ... “É doce ao espírito saber que um eco responde ao que ele pensou, e mais ainda se o pensamento, trasladado ao papel, é guardado entre as coisas mais queridas de alguém.” ... “Amigo muito agradecido, Machado de Assis.

Mais extraordinário que a circunstância do início da correspondência entre ambos é o fato de que nunca se encontraram presencialmente. Belmiro se deslocava freqüentemente de Minas para o Rio, com o objetivo de adquirir mercadorias de atacadistas. Ficava rondando a casa de Machado, observando tudo, sem coragem de chegar. Um dia Machado saiu de casa e tomou o bonde. Belmiro quase aproveitou esta oportunidade de se apresentar, mas a timidez foi maior. Sentou-se mais atrás e acompanhou oculto todo o passeio de seu mestre. E isso se repetiu em outras viagens.

Sobre a morte de Machado, diz o próprio Belmiro Braga: “Quando morreu, o meu retrato foi encontrado sobre a sua mesa, um amigo mandou-me flores retiradas de seu féretro e dois oradores, dando-lhe o último adeus, referiram-se ao meu nome...” Antes Belmiro enviara-lhe carta consolando-o da ausência de Carolina. Machado respondeu: “E já que se referiu na sua carta à Carolina, mando-lhe estes versos que acabo de compor.” Completa Belmiro: “E mandou-me o soneto À CAROLINA, que conservo entre os papéis que mais prezo... E eu, que o vi tantas vezes, que o admirava tanto e que tanto lhe queria, nunca tive ânimo de dizer-lhe quem era e de apertar-lhe a mão...”

terça-feira, 1 de junho de 2010

CINQUENTENÁRIO DA COMERCIALIZAÇÃO DA PÍLULA ANTICONCEPCIONAL – TRIBUTO A ALOÍSIO RESENDE NEVES

João Amílcar Salgado

O mineiro Aloísio Resende Neves diplomou-se na Faculdade de Medicina da atual Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 1935 e, em 1941, fez a primeira comprovação em indivíduo humano do efeito contraceptivo dos hormônios sexuais. Estes hormônios eram até então tidos como conceptivos pelos ginecologistas, endocrionologistas e urologistas. Este fato, que é um marco na história geral da medicina, se ocorresse em qualquer outro país, seria utilizado para promoção nacional e proclamado permanentemente. Aqui, sobretudo na religiosa e ultraconservadora Minas Gerais da década de 40 do século 20, o tema de sua conquista científica foi considerado antes de tudo indecente, não havendo condições sequer para que sua publicação fosse adequadamente apreciada pelos próprios cientistas mineiros. Mesmo assim é no mínimo estranho o silêncio de Baeta Viana sobre o assunto. Mais tarde, quando de tal conhecimento resultou a revolucionária introdução da pílula anticoncepcional na vida moderna, então as razões para ignorar a primazia de Aloísio Resende Neves foram reforçadas pelo interesse econômico dos que participaram do arranjo sobre as respectivas e bilionárias patentes comerciais.

A primeira evidência de que os hormônios sexuais eram contraceptivos, em vez de conceptivos, foi obtida em animais, em 1921, por Gottlieb Haberlandt, um botânico austro-húngaro (também desenhista e músico), que antes ficara famoso por ter descoberto a cultura (clonagem) de células (no caso vegetais) e investigava hormônios vegetais. Esta evidência ficou limitada ao âmbito da biologia e foi ignorada por pesquisadores médicos e mais ainda pelos clínicos em seus consultórios, nomeadamente os citados ginecologistas, endocrinologistas e urologistas. No histórico da pílula anticoncepcional, a maioria dos autores costuma iniciar pela data de 1960, com o nome de Gregory Pinkus, o que é um erro elementar, ainda mais por dar-lhe o título de pai da pílula. Pinkus foi apenas o experimentador em massa (e em condições anti-éticas) da progestina, descoberta quase dez anos antes.

Os registros mais isentos da literatura realmente científica dão como marco inicial a data de 15 de outubro de 1951, quando o jovem mexicano Luís Ernesto Miramontes Cardenas, estagiário de química no laboratório de Carl Djerassi (vienense filho de judeu búlgaro), fez revolucionária descoberta. Pela primeira vez, a partir de um vegetal, a batata doce nativa do México, criou um análogo sintético da progesterona animal. Quimicamente, inaugurou a família dos progestágenos de síntese ou progestinas. O novo produto, um anovulatório, passou a ser chamado de noretindrona ou norestirona e foi patenteado por Miramontes, Djerassi e Jorge Rosenkranz para a companhia química mexicana Syntex. Djerassi, depois, se tornaria famoso também como escritor e autor teatral e, em suas peças, aborda disputas por precedência científica, certamente com base em seu próprio envolvimento nesta descoberta.

Entre a verificação realizada em animais, em 1921, pelo botânico Haberlandt e a síntese obtida pelo químico Miramontes, em 1951, teria transcorrido um silêncio aparente de trinta anos. Tal silêncio, entretanto, de fato não ocorreu, pois houve a contribuição do cirurgião brasileiro Aloísio Resende Neves, que, em publicação de agosto de 1941, documentou, pela primeira vez no indivíduo humano, o efeito contraceptivo dos hormônios sexuais. Seu artigo foi publicado na revista médica brasileira O HOSPITAL com o título CAPACIDADE ESTERILIZANTE TEMPORÁRIA DOS HORMÔNIOS ANDROGÊNICOS. Sua verificação foi propiciada por uma paciente de aspecto feminino normal e que tinha tido filhos. Desenvolveu masculinização progressiva e foi operada por Neves que lhe removeu tumor masculinizante benigno. Após a operação voltou a ter seu aspecto feminino anterior e voltou a ter filhos. Durante a masculinização prosseguiu tendo relações sexuais com o marido e não houve gravidez. O cirurgião então concluiu que o excesso de hormônios androgênicos esterilizara seu sistema reprodutor.

Embora houvesse evidencia de tal fenômeno em animais de experimentação, o fato não tinha sido documentado em indivíduo humano, como sobredito, e nem os livros especializados o assinalam. Ao contrário nesta época a noção geral era de que os hormônios sexuais eram fecundantes ou conceptivos. Assim o mérito do médico mineiro Aloísio Resende Neves é incontestável, sua primazia está documentada e ele tem o direito de ser considerado o descobridor da anticoncepção hormonal humana, ou seja, o princípio da pílula anticoncepcional.

Nem sequer é possível alegar que seu feito foi ignorado por ter sido publicado em revista médica brasileira e em português. Isso porque o periódico O HOSPITAL era indexado na data de agosto de 1941, ou seja, seu artigo consta do INDEX MEDICUS. Há documentação oriunda de autoridades científicas dos EUA que reconhecem sua primazia. Já em relação à patente da descoberta, as autoridades daquele país alegam que teria de ter sido requerida à época, o que Neves não fez. Este então, em demanda judiciária, passou a solicitar que reconheçam sua patente a posteriori, como foi feito recentemente para descobertas japonesas, em acordo para que o Japão entrasse no sistema internacional de patentes. Como a soma devida ao descobridor mineiro seria altíssima, ele a ofereceu para pagamento da dívida externa brasileira. Sua reivindicação prossegue desatendida.

Circunstancia interessante da descoberta de Aloísio Resende Neves (parente de Oto Lara Resende e de Tancredo Neves) foi o fato de que tal tema era considerado indecente mesmo entre a comunidade médica, mais ainda na conservadora sociedade mineira da época, dominada pelas posições radicais do bispo Antônio Cabral. Logo que circulou a notícia de suas conclusões, ele passou a ser alvo de chacota por parte de colegas médicos, foi proibido pelo bispo de pronunciar conferência na Santa Casa e foi obrigado a deixar seu cargo de assistente na Faculdade de Medicina da Universidade de Minas Gerais (hoje UFMG).

Muitas pessoas usavam preparações hormonais, pois era uma novidade científica com o nome de opoterapia. Um dos usuários era o próprio médico Juscelino Kubitscheck que tinha voltado com este hábito da clínica onde estagiou em Paris. Como o futuro presidente estava casado e sem filhos, seu caso foi evidencia adicional a Neves, que o aconselhou a suspender a opoterapia e em conseqüência o casal teve uma filha

O autor é professor titular de Clínica Médica e pesquisador em História da Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais